Entrevista: Ledderplain

Da Régua, cidade transmontana nas margens do Rio Douro, surgiu um dos mais excitantes coletivos nacionais e 2017 viu o lançamento de um dos melhores discos nacionais do género. O vocalista dos Ledderplain, Vítor Hugo Carvalho, fala-nos desta pérola que se chama The Ancient Tales Of Abbadon e de toda a evolução que banda sofreu nos últimos anos.

Olá Vítor, como estás? Para começar, podes apresentar os Ledderplain? Quando surgiram e com que objetivos se uniram?
Olá pessoal da pesada! Os Ledderplain são um coletivo do Peso da Régua constituído atualmente por 5 elementos (Carlos Alves na bateria, João Vicente no baixo, João Martins e Manuel Cardoso nas guitarras e Vítor Carvalho na voz). Surgimos do conhecimento que o pessoal já tinha uns dos outros desde que tocaram todos, de uma forma ou de outra, numa “escolinha de música” que havia aqui na cidade. A ideia inicial foi dar os primeiros passos a tocar umas covers de rock/grunge da altura, entretanto com a entrada do ex-vocalista (Rangel Coutinho) e do ex-membro fundador (David Francisco Montezinho), a banda apontou para o heavy metal com fortes influências de Maiden, DIO, Judas Priest, etc. A evolução continuou nessa vertente até que se decidiu começar a fazer originais e é nessa base que estamos até hoje, juntando por vezes num concerto um ou outro trabalho dessas bandas de influência mas tendo como objetivo principal a nossa própria expressão através de temas originais.

Que nomes ou movimentos mais vos influenciaram para a criação da banda?
Conforme foi dito anteriormente, na formação original da banda a ideia eram umas covers do rock/grunge da praxe: Nirvana, Alice In Chains, Pearl Jam, tendo em conta que o pessoal tinha 15/16 anos, ora quando a formação original da banda foi apresentada ao heavy metal não quis mais nada (risos), e começou a ouvir muito da influência NWOBHM que tal está patente no nosso 1º trabalho de originais.

Qual é o background musical dos membros dos Ledderplain?
Individualmente temos em comum o tal rock/grunge, se bem que depois cada um de nós evoluiu para gostos diferentes, onde se confundem o acid rock de 60’s, o stoner rock, outras vertentes de metal como o progressivo, o gótico e o industrial. Instrumentalmente temos o baterista (Carlos Alves) que tem instrução a nível de piano clássico desde cedo, o guitarrista (João Martins) que tem a música popular no seu currículo, os restantes elementos foi na tal “escolinha de música” que tiveram o contacto com o mundo da música.

Foquemo-nos agora no vosso primeiro trabalho. Sendo que têm um disco de bastante qualidade entre mãos, sentem que o vosso trabalho tem vindo a ser reconhecido?
É uma resposta ambígua porque se por um lado sentimos que sim, que o pessoal que ouve o álbum tem reconhecido esse trabalho e qualidade e dá-nos feedbacks muito positivos e confiança para continuar, por outro lado sentimos que o rock/metal está adormecido para os novos talentos. Há dificuldade em arranjar concertos cujas condições sejam apropriadas para o desenvolvimento de uma banda e há pouco espaço nos grandes palcos para bandas novas porque sem essa experiência de estrada e de convívio com o universo metal é mais lenta a evolução cultural e técnica. Por exemplo: convidarem-nos para tocar em Lisboa e o pagamento proposto serem 100 euros. Ora é fácil perceber que é muito complicado para uma banda de Trás-os-Montes conseguir a logística e a sustentabilidade para fazer face às despesas de transporte, alimentação e/ou alojamento, já para não falar do desgaste de material etc. Resumindo e concluindo, sim, sentimos esse reconhecimento por parte do público que nos ouve, mas fazemos força para que os responsáveis por organização de eventos rock/metal assumam a responsabilidade de serem eles os promotores de novas bandas, novas correntes e consequentemente novos adeptos do género.

Como decorreu o processo de composição?
Este EP é uma mistura entre temas antigos e alguns mais recentes, que tiveram como base de composição o universo Abaddon, que foi um tema escolhido por nós para primeiramente expor a nossa identidade. A parte instrumental surge inicialmente por norma da criatividade do João Martins, que em casa cria linhas de guitarra que depois são apresentadas e desenvolvidas em ensaio com os restantes elementos. O atual baixista (João Vicente) teve também posteriormente um cunho muito forte na dinâmica da linha do baixo pois sendo ele de uma “escola” diferente do anterior baixista (David Franscisco Montezinho) existiu uma fusão de diferentes ideias que vieram, a nosso ver, enriquecer bastante as nossas composições. As letras atualmente têm muita influência do vocalista (Vitor Carvalho), mas como a ideia de composição da narrativa é comum a todos, há sempre ideias que surgem de todos os elementos e são adaptadas. Por exemplo, o nosso último tema (não editado) foi escrito pelo guitarrista (Manuel Cardoso) e até temos o nosso grande amigo Arnaldo Silva a dar também ele as suas dicas, portanto podemos dizer que há quem assuma uma maior responsabilidade criativa em certas partes, mas que posteriormente acabamos todos por ter influência na composição dos temas.

Podes falar-nos um pouco da vossa experiência em estúdio? Correu tudo como previsto? Sentiram algum tipo de dificuldade?
Não correu tudo como previsto, sentimos alguma dificuldade na adaptação da sala de ensaios para a sala de estúdio, até porque foi a nossa primeira grande e séria experiência em gravação. A nível do que tínhamos em mente para gravar, a nível da composição e da sonoridade que procurávamos nós tínhamos essa parte estudada, mas a nível técnico teve sem dúvida que haver um elevar do patamar de qualidade e foi extremamente importante para todos que tal tenha acontecido porque foi perante as adversidades e níveis de exigência superiores que a banda teve que evoluir. Levamos mais horas em estúdio do que aquilo que inicialmente se projetou mas tal também se deve à procura exaustiva pela sonoridade certa, e pela exigência que o João Martins tem em que tudo seja meticulosamente cumprido. Uma parte não menos importante foi o produtor André Guerra (AG – Recording Studio) que teve que levar connosco durante este processo todo de crescimento e que o “obrigou” também a ele a subir a fasquia de paciência (risos), e consequentemente a aprendizagem que com certeza também teve, em lidar connosco quer do ponto de vista musical tanto com social.

Para quem não vos conhece, como descreverias a sonoridade presente neste conjunto de temas?
Nós achamos que esta sonoridade é produto de várias influências, pois à data que foi gravado já tínhamos mudado a formação original sendo que alguns dos temas já vêm dessa formação, mas temos depois uma forma diferente de as atacar fruto das diferentes “escolas” que acrescentamos pelo caminho com a entrada de outro baixista e vocalista como já foi referido. A ideia base é a influência clara do estilo NWOBHM na qual se fundiram essas tais novas ideias. Sendo que queríamos fazer um álbum que não fugisse às raízes da criação da banda, a ideia está patente na forte influência de um heavy metal melódico com nuances de hard rock onde começou a formação original. Fizemos, a nosso ver, um álbum equilibrado, porém bastante versátil onde expomos aquilo que como banda podemos ser ao nível da criação, ou seja, nada comprometidos com a narrativa no entanto não descuramos a objetividade dos temas, apostando sim em misturar contextos mais energéticos e outros mais introspetivos para que consigamos permitir ao ouvinte uma jornada sensorial, neste caso, uma jornada pelo “universo Ledderplain”.

Como está a ser a apresentação do EP ao vivo?
Muito bem recebida, se bem que já nos apresentávamos com estes temas ao vivo antes do lançamento do álbum, mas a diferença antes e pós estúdio é pelo menos entre nós, clara. E acho que é essa a grande vantagem que temos na apresentação deste EP. Podem esperar um concerto mais objetivo, mais contextualizado no que é a imagem e som da banda, assim como uma prestação técnica superior fruto do tal crescimento a que fomos obrigados aquando da gravação. Arrisco-me a dizer que quem nos ouviu antes e nos ouve agora nota uma clara evolução e consegue, talvez, agora perceber melhor a nossa linha de composição e a tal versatilidade sonora em que apostamos.

Projetos para o futuro?
Queremos gravar um novo álbum em breve, estamos agora a equilibrar o que é ensaiar para os atuais concertos e ter tempo para pensar novas composições. Queremos, sem dúvida, estar mais presentes no panorama musical regional e nacional pois achamos que temos essa vontade e qualidade para subir esses degraus, mas para tudo tem que haver tempo e para já vamos assumindo o presente como sendo o que queremos promover. Para bandas do interior o futuro é algo que acarreta muita perseverança e vontade, mas acreditamos no nosso trabalho e desejamos mesmo é que todos os leitores e ouvintes de música em geral possam ter a oportunidade de nos ouvir ao vivo num evento perto deles, pois seria um sinal positivo do tal reconhecimento.

Obrigado. Queres acrescentar mais alguma coisa?
Queremos deixar uma palavra de agradecimento a toda a gente que fez, direta ou indirectamente, parte da gravação deste EP, às nossas famílias e amigos: David Francisco Montezinho, Rangel Coutinho, José Miguel Montezinho, Arnaldo Silva, Bruno Almeida, André Guerra, por todo o apoio e participação que tiveram nesta nossa jornada até agora e esperamos que de futuro possamos acrescentar ainda mais nomes a este agradecimento para que todos juntos possamos levantar de novo este grandioso universo metal. Um muito obrigado também ao Via Nocturna por todo o apoio e oportunidades de divulgação que nos tem proporcionado. Um abraço a todos. Ouçam Ledderplain! Rock On!

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